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5 maio 2025

Ler o mundo para ler a palavra: caminhos para uma leitura crítica da realidade

O desafio dos algoritmos

Um estudo recente do Reuters Institute, vinculado à Universidade de Oxford, na Inglaterra, mostra que, no Brasil, as mídias sociais (51%) já superam a televisão (50%) e a mídia impressa (11%) como principal fonte de notícias. Essas plataformas digitais estão moldando os hábitos das gerações mais novas, que costumam dar mais atenção a influenciadores e celebridades do que a jornalistas – mesmo quando se trata de temas noticiosos.

Mas o cenário vai além da mudança de canais e personagens. Hoje, acessamos notícias em um mesmo feed (área nas redes sociais onde são apresentadas as atualizações de conteúdos), filtrado por algoritmos, onde circulam vídeos de gatinhos, teorias da conspiração, opiniões polarizadas e conteúdos produzidos por inteligência artificial, muitas vezes sem qualquer aviso. Nesse ambiente, tudo parece ter o mesmo peso, a mesma aparência e a mesma urgência. Como, então, podemos nos informar bem e sermos leitores críticos da nossa realidade?

Informar-se não é apenas acumular dados ou estar por dentro do que acontece. Informar-se é formar-se – construir sentidos, elaborar visões de mundo, reconhecer contextos e fazer escolhas conscientes. É exatamente disso que falava Paulo Freire, no livro “A importância do ato de ler: em três artigos que se completam”, ao dizer que “ler o mundo precede a leitura da palavra”. 

Em um tempo em que os algoritmos escolhem o que vemos, o desafio não é apenas acessar notícias, mas desenvolver a capacidade crítica para compreendê-las, interpretá-las e utilizá-las para transformar o contexto em que vivemos.

 O retrato brasileiro: leitura crítica em crise

No Brasil, apenas 2% dos estudantes atingiram os níveis mais altos de proficiência em leitura no PISA (avaliação educacional coordenada pela OCDE que mede o desempenho de alunos de 15 anos em leitura, matemática e ciências). A média dos países da OCDE é de 7%. Estamos falando de um grupo muito pequeno de pessoas que consegue compreender textos longos, interpretar conceitos abstratos ou contraintuitivos e diferenciar fato de opinião com base em sinais sutis de linguagem, contexto ou fonte. 

Em outras palavras, são poucos os que dominam a leitura não como decodificação de palavras, mas como prática crítica – aquela necessária para que tenhamos autonomia e protagonismo como sujeitos de direitos. 

Regulação e direitos

Agora, o que fazer neste cenário de desordem informacional e violações sistemáticas de direitos humanos? A Austrália aprovou uma lei para proibir que menores de 16 anos tenham contas em mídias sociais – ela entra em vigor em dezembro deste ano. No Reino Unido, discussões parecidas tem acontecido. Essas medidas, embora bem-intencionadas, podem também representar riscos para o exercício dos direitos de crianças e adolescentes. Afinal, o acesso à informação e à livre expressão também são direitos fundamentais.

No Brasil,  o MEC (Ministério da Educação) restringiu o uso de celulares nas escolas. A sociedade deu muita atenção a isso. Mas a mesma resolução que determina essa proibição também obriga as escolas a implementarem currículos de educação midiática e digital a partir de 2026.

É preciso ação para a educação midiática

Recomendações não determinam a prática e portanto, podem não se concretizar por absoluta falta de conexão com as muitas realidades existentes em um país tão diverso quanto o nosso. A tentativa de proteger crianças e adolescentes dos efeitos nocivos da vida digital não pode resultar em soluções simplistas. Neste momento, precisamos reforçar os diferentes caminhos possíveis e a responsabilidade de toda a sociedade.

Por um lado, precisamos de coragem política para aprovar uma regulação eficiente das plataformas, que garanta mais transparência e responsabilidade corporativa sobre seus impactos sociais, com mecanismos reais de proteção à infância e eficácia em suas implementações. Ao mesmo tempo, precisamos investir de forma estrutural na formação leitora — e isso significa ir muito além da alfabetização funcional. Significa promover uma leitura de mundo: aquela que prepara os jovens para interpretar, questionar, agir e intervir no mundo em que vivem, tanto no ambiente físico quanto no digital.

Fonte: Porvir

Imagem by jcomp on Freepik